A despeito da nova legislação, não houve alteração nos principais pedidos das demandas, que continuam sendo horas extras, insalubridade e o pagamento de verbas rescisórias
A reforma trabalhista foi implementada por meio da Lei nº 13.467, de 2017, sancionada com a promessa de reduzir a burocracia na contratação e, por consequência, gerar novos empregos, modernizar a legislação trabalhista e, assim, impulsionar o crescimento econômico, além de promover a redução do número de ações trabalhistas ajuizadas.
A redução do número de ações se daria, em especial, pelas regras mais rígidas para o ajuizamento da reclamação e riscos vindos de uma eventual improcedência ou procedência parcial dos pedidos, a exemplo da condenação do empregado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais.
Segundo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), nos primeiros cinco anos de lei houve uma redução de 42% no ajuizamento das ações. No entanto não houve alteração no percentual de procedência, em torno de 27% e 31%.
Para o presidente da Corte, ministro Lelio Bentes, após quase sete anos em vigor, no início, houve uma redução do número de ações, no entanto, provocada “não pela pacificação do conflito, mas por uma ameaça”, referindo-se à condenação do empregado ao pagamento das custas judiciais e honorários sucumbenciais.
Todavia, a promessa relativa à redução das ações não se sustentou, principalmente após decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), nos autos da ADI 5766, que declarou a inconstitucionalidade dos artigos alterados pela reforma trabalhista, em especial artigo 791-A, parágrafo 4º, da CLT, que determinava o pagamento de custas e honorários advocatícios pelo trabalhador, havendo, por conseguinte, a retomada dos ajuizamentos.
Não houve, de fato, um aumento no número de ações, mas após a decisão proferida pelo STF, que reduziu os riscos de condenação do empregado, é possível observar um aumento nos processos ajuizados, embora ainda em quantidade inferior. A principal alteração, com maior impacto na redução do ajuizamento dessas ações, foi a obrigatoriedade de pagamento de pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais pelo empregado.
De acordo com regra instituída, o reclamante, ainda que beneficiário da justiça de gratuidade, também seria obrigado a pagar os honorários sucumbenciais, estes a serem abatidos de eventual crédito apurado no processo.
Com relação às custas processuais, a nova regra instituiu que o não comparecimento do empregado em audiência importará não apenas no arquivamento do processo, mas também no respectivo pagamento das custas, mesmo que beneficiário da justiça gratuita.
Destaca-se, por sua vez, que o pagamento correspondente às custas processuais é condição para a propositura de nova reclamação, ressalvada comprovação de justificativa legal para o não comparecimento.
Os setores relacionados ao comércio, prestação de serviços e construção civil são os que mais contratam e, por conseguinte, os que mais figuram nos cadastros dos tribunais.
De acordo com dados recentes divulgados pelo TST e Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2023, foram ajuizados 3,5 milhões de novos processos trabalhistas no Brasil, envolvendo, principalmente, os setores relativos à construção civil, comércio e serviços, além das indústrias e o setor de tecnologia.
Vale destacar que, a despeito da nova legislação, não houve alteração nos principais pedidos das demandas que continuam sendo horas extras, insalubridade e o pagamento de verbas rescisórias.
Conforme informações divulgadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a indústria da construção civil, por exemplo, encontra-se elencada no setor com maior incidência de autuações trabalhistas, em especial, devido ao não cumprimento de normas de segurança e saúde no trabalho (NR 18).
Por sua vez, com o advento da pandemia e consequente aumento das demissões e inadimplência empresarial, em especial no setor dos serviços, houve uma alta no volume de processos relacionados à rescisão contratual e pagamentos atrasados.
O aumento ou estagnação do número de ações trabalhistas após a reforma trabalhista de 2017 tiveram impactos econômicos e sociais relevantes, afetando tanto o mercado de trabalho como a economia em geral e, por certo, o sistema judiciário.
Por outro lado, os aumentos de ações impactam na produtividade e no crescimento econômico. Isso porque a insegurança jurídica e constante judicialização findam por desestimular investimentos no setor privado. Não por outro motivo, muitos empregadores optam por terceirizar ou promover contratações informais, o que pode agravar a precarização das condições de trabalho e, com o contrassenso, gerar novas demandas judiciais.
A estagnação ou redução do número de ações poderia refletir uma tendência de maior confiança nas relações de trabalho e negociação individual, conforme implementadas pela reforma.
Todavia, é importante destacar que a redução ou estagnação também poderia mascarar uma realidade de trabalhadores que, diante da hipossuficiência, receio de consequências advindas da ação judicial ou até mesmo pela falta de representação sindical, optam por não recorrer ao Judiciário na busca de seus direitos, o que representaria uma perda de direitos trabalhistas conquistados ao longo de décadas.
Elisa Alonso é pós-graduada em Direito Público e Direito do Trabalho, foi vice-presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB-DF e tem atuação ativa no TST.
Fonte: Valor Econômico