PAC sente efeito de ajuste fiscal e aposta em setor privado

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Lu Aiko Otta

Programa completa um ano, com ministérios em ritmos diferentes de execução dos investimentos até o momento

Vitrine dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) completou um ano no dia 11 de agosto num ambiente em que a situação das contas públicas impede a expansão dos investimentos com recursos orçamentários. Assim, o programa apresenta melhores perspectivas em sua vertente privada, avaliam especialistas.

Até o dia 23 passado, o governo federal havia empenhado (reservado para algum pagamento específico) R$ 37,2 bilhões, ou 68% do total de gastos autorizados. Os valores liquidados, que refletem a entrega de obras e serviços, somavam R$ 13,2 bilhões (24,3%), segundo dados levantados pelo Valor no Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop). A parcela do PAC financiada com recursos do Orçamento representa 24% do total. Alguns ministérios conseguiram empenhar parcelas grandes de suas verbas.

O de Transportes, por exemplo, dispõe de R$ 14,4 bilhões e empenhou R$ 11,7 bilhões. Na Defesa, dos R$ 5,5 bilhões disponíveis, R$ 4,8 bilhões já estão comprometidos com algum contrato. A pasta de Desenvolvimento Social e Combate à Fome já empenhou praticamente toda a verba disponível para o PAC, R$ 420 milhões.

Por outro lado, a execução é baixa em pastas como a de Ciência, Tecnologia e Inovação, que dispõe de R$ 2,9 bilhões e empenhou R$ 300,5 milhões até agora.

De acordo com a Casa Civil, o desempenho se explica “pelo grande porte e complexidade dos empreendimentos” a cargo do ministério, alguns em fase inicial de implantação, como é o caso do laboratório de máxima contenção biológica NB4 – Orion, em Campinas (SP).

Para o último trimestre de 2024, está previsto o empenho de R$ 1 bilhão destinado aos empreendimentos Reator Multipropósito Brasileiro, Laboratório Orion (NB4) e Infovias executadas pela Rede Nacional de Pesquisa (RNP), acrescentou a Casa Civil.

O Ministério das Comunicações dispõe de R$ 116,2 milhões, mas até o dia 23 de agosto o empenho era zero. De acordo com a Casa Civil, a maior parte das verbas da pasta destinada ao PAC vem de fora do Orçamento da União. “Cita-se como exemplo os recursos privados para a expansão do 4G e implantação do 5G pelas empresas de telecomunicações vencedoras do leilão do 5G (R$ 13,5 bilhões) e para construção das infovias no Norte Conectado (R$ 1,5 bilhão), projetos em plena execução física.”

Segundo os dados do Siop, o Ministério da Educação dispõe de R$ 4,4 bilhões para investir no PAC e até o dia 23 de agosto havia empenhado R$ 2,7 bilhões.

A Casa Civil disse que decreto de programação financeira editado em fevereiro deste ano autoriza a pasta a empenhar até R$ 2,9 bilhões até o dia 30 de setembro. “O valor empenhado até 31 de julho de 2024 era de R$ 2,43 bilhões, correspondente a 83% do limite, o que representa uma execução orçamentária acima do esperado para esse período.”

Caso semelhante ocorre com o Ministério da Saúde. A pasta dispõe de R$ 7,9 bilhões no Orçamento e havia empenhado R$ 3,1 bilhões até 23 de agosto. Também nesse caso, o decreto de programação financeira de fevereiro estabeleceu limite de R$ 4 bilhões até o dia 30 de setembro. “O valor empenhado até 31 de julho de 2024 era de R$ 2,85 bilhões, correspondente a 72% do limite, o que representa uma execução orçamentária bastante satisfatória”, avaliou.

Os números mostram um desempenho nem excepcional nem ruim, comentou Roberto Figueiredo Guimarães, diretor de Planejamento e Economia da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) e ex-secretário do Tesouro Nacional.

Ele acrescentou que, além dos investimentos do PAC autorizados no Orçamento em 2024, também estão sendo injetados na economia pagamentos de obras contratadas em anos anteriores – os chamados “restos a pagar”. No caso dos Transportes, aos R$ 4,6 bilhões liquidados até agora, devem-se somar R$ 4,2 bilhões de anos anteriores que estão sendo pagos. “Quase dobra”, comentou. Assim, o desempenho dos investimentos em infraestrutura é melhor do que aparentam os números colhidos pelo Valor.

Além disso, acrescentou Guimarães, existe a parcela do PAC que não depende de recursos do Orçamento – caso das concessões e Parcerias Público-Privadas (PPPs). Levantamento da Abdib aponta que os investimentos realizados pelas concessionárias no primeiro semestre deste ano ficaram 12% acima do observado em igual período em 2023. A grande quantidade de contratos assinados este ano trará reflexos positivos em 2025 e 2026. “Não tenho a menor dúvida de que vai aumentar.”

Além da parte orçamentária, o PAC contempla investimentos das empresas estatais, com R$ 343 bilhões, além de financiamentos estimados em R$ 362 bilhões e recursos privados, da ordem de R$ 671 bilhões, informou a Casa Civil.

“A salvação que existe para o PAC é a parcela fora do Orçamento”, disse o professor Marcos Mendes, do Insper. A parte que depende de recursos públicos sofre com o cenário fiscal. Dado o crescimento forte das despesas obrigatórias, como aquelas atreladas ao salário mínimo e os pisos de despesas com saúde e educação, restou pouco para cortar. “O PAC virou a única válvula de escape para se fazer algum ajuste fiscal”, avaliou.
Um sintoma da falta de espaço para ampliar investimentos é a busca por recursos extraorçamentários, comentou. Por exemplo, a expansão do vale-gás anunciada na semana passada.

O problema fiscal coloca o PAC em um dilema, segundo o economista Claudio Frischtak, da consultoria Inter.B. A falta de credibilidade do mercado em relação às contas públicas, acaba pressionando os juros e encarecendo os investimentos. Ao mesmo tempo, a fragilização a política fiscal exacerba a disputa por recursos e dificulta novos aportes no PAC.
Uma forma de trazer mais recursos para o programa seria reforçá-lo com emendas de parlamentares ao orçamento, sugeriu o economista.

O advento do Novo PAC não eleva os investimentos de forma a romper o padrão das últimas duas décadas, notou o especialista. Investimentos públicos, privados e agregados deverão ficar na casa dos 2% do Produto Interno Bruto (PIB). O estoque de capital deverá atingir neste ano 35,5% do PIB – o desejável seria 65% do PIB.

Investimentos poderiam crescer com o prosseguimento da agenda que dá mais segurança jurídica à atuação do setor privado, avaliou Frischtak. Por exemplo, evitando a politização de agências reguladoras.

Fonte: Valor Econômico