Ora, direis… importar engenheiros?

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Jornal do CommercioOpiniãoA-1529/08/2013

Ora, direis… importar engenheiros?

Francis Bogossian, presidente da AEERJ, do Clube de Engenharia e vice-presidente executivo da Academia Nacional de Engenharia

  A importação de engenheiros é mais uma proposta equivocada do poder central, se for mesmo levada adiante pelo governo brasileiro. Caso o objetivo seja trazer engenheiros estrangeiros para suprir uma demanda localizada das nossas prefeituras carentes de infraestrutura, é necessário e indispensável, em primeiro lugar, ouvir as partes interessadas. Não apenas escutar os executivos municipais, que terão que arcar com os ônus destas contratações, mas também, de forma democrática, saber o que as classes profissionais pensam desta medida. Solicitar aos prefeitos que informem sobre as medidas que tomarão para receber os engenheiros estrangeiros em suas equipes e garantir os meios para que eles sejam produtivos. E, também, que forneçam os detalhes dos planos de carreira que podem oferecer. Caso contrário, será apenas um factóide eleitoreiro para apresentar nas propagandas gratuitas da TV. Se o plano não fracassar até as eleições de 2014, esta artimanha pode funcionar como “mais uma conquista”.

Em uma atitude já efetivada de forma estapafúrdia pelo Ministério da Saúde, sem que fosse respeitada, ou sequer ouvida, a categoria dos médicos. Fingiu-se uma total cegueira quanto aos reais problemas na área da saúde pública localizados, principalmente, na falta de infraestrutura do sistema e das unidades hospitalares, em sua grande maioria, sucateadas e pessimamente administradas. É só esperar para ver no que vai dar e como ficará o custo-benefício desta decisão para o contribuinte. Isto sem citar o absurdo de que os médicos cubanos trabalharão aqui com salário bem menor que os advindos de outros países, contrariando, inclusive, a legislação brasileira do trabalho, quanto à isonomia funcional.

Sabemos que a profissão de engenheiro esteve em baixa e só voltou a ser atrativa com a retomada do desenvolvimento. Nas duas décadas finais do Século XX a carreira era instável e remunerava mal, pelas incertezas do mercado de projetos e obras. Muitos engenheiros mal pagos ou desempregados investiram em atividades outras. Encontro ainda engenheiros civis motoristas de táxi, por exemplo, que desistiram de tentar empregos naquela época.

Quem abandonou ou desistiu da carreira precisaria de intensa reciclagem para voltar ao mercado depois de alguns anos, mormente diante dos monumentais avanços tecnológicos ocorridos no período. Isto, no entanto, não se coaduna com a carência educacional registrada em todos os níveis do ensino brasileiro. Estatísticas que organizações internacionais hoje disponibilizam são claras e cristalinas quanto aos problemas que o Brasil enfrenta na área da educação.

Ainda não se conseguiu sair das falsas promessas de campanha, esquecidas já no primeiro dia de poder. Uma nação que não consegue resolver seus gargalos no ensino fundamental, a base de tudo, não terá como estruturar-se no ensino superior. O mercado de trabalho na engenharia civil pode até estar em fase de demanda, mas sem planos de carreira nas prefeituras do interior, talvez só mesmo os cubanos aceitem empregos para sobreviver. Se o governo quiser provar que importar engenheiros é bom para o Brasil, que comece por ouvir as partes interessadas. Ações de cunho político autoritário e não democráticas só servirão para agravar as mazelas já institucionalizadas na engenharia de obras públicas do país.