O Enem: em vez da “preçocracia”, a “meritocracia”
Francis Bogossian,
Membro Efetivo das Academias Brasileira de Educação,
Nacional de Engenharia e Pan-Americana de Engenharia
Na contramão dessa coisa monocórdia, dessa mania que se tem de ver as questões apenas por um ângulo, propomos a vocês uma reflexão. Desde 1998, quando o Enem foi criado, até 2008, só uma instituição era responsável pelo exame: a Fundação Cesgranrio. A ela o exame era entregue totalmente, da elaboração das questões à gráfica, à distribuição das provas, à coordenação do concurso, à divulgação dos gabaritos. Naqueles 11 exames consecutivos, envolvendo milhões de alunos no país inteiro, simultaneamente, jamais problema algum ocorreu.
Não houve motivo para reclamações e muito menos para manchetes nos jornais. Em 2007, devido ao grande número de alunos inscritos, que praticamente dobrou, a Fundação Cesgranrio decidiu realizar o exame junto com o Cespe, da UnB. Sem problemas, sucesso total. Assim como em 2008. No ano passado, nem o Cespe nem a Cesgranrio quiseram fazer o Enem, devido ao prazo exíguo para a sua realização proposto pelo MEC. O Cespe, aliás, nem entrou na concorrência. E a Cesgranrio se retirou dela.
Nos exames de 2009 e de 2010, todos os problemas apresentados envolveram a gráfica e a falta de um controle mais rigoroso do que é realizado na gráfica. Controle que, a partir do ano passado, passou a ser função do Inep. O que nos leva a concluir que o calcanhar de aquiles, a origem de todos os problemas do Enem, está na licitação. Quando os concorrentes que botam o preço lá embaixo vencem sempre, o critério deixa de ser o do mérito, prevalecendo o do preço.
O Enem é um exame estratégico para um projeto prioritário de país, que é o da educação. No governo Dilma, então, mais ainda do que no de Lula, pois a presidenta eleita, desde o primeiro discurso, explicitou sua meta de valorizar a educação, os professores, seus salários, sua formação.
O governo da “Meritocracia”, proposto por Dilma, não combina absolutamente com a “Preçocracia” aplicada no Enem. O Ministério da Educação, para a realização do Exame Nacional de Ensino Médio, na proporção que ele acontece, num país com as dimensões do nosso, precisa e deve ter a autonomia de escolha das entidades de sua confiança, com qualidade e experiência reconhecidas, para a certeza do fazer bem-feito. Sem escândalo, sem manchetes. Sem sensacionalismo dos jornais nem capas de revistas, nem juízes federais, na tentativa de ajudar, contribuindo para atrapalhar ainda mais e prejudicar um projeto que vinha sendo tão bem realizado.
O Enem sempre foi considerado um exemplo internacional na aplicação de exames. Por todos os motivos expostos, propomos que o critério do Enem seja o mesmo aplicado para a realização das eleições no Brasil, motivo de nosso orgulho, com nossas urnas eletrônicas invioláveis e a apuração dos votos em tempo recorde. Isto é: o critério do Enem deve ser o da qualidade e o da relação de confiança, não o do preço. Reiteramos o que sempre dizemos: mais vale o melhor preço do que o menor preço.