Lei das Estatais sobrevive a mais uma tentativa de mudança

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O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou, na semana passada, a validade da Lei das Estatais, novamente posta em xeque por interesses políticos. Aprovada em 30 de junho de 2016 sob o impacto dos casos de corrupção em estatais, notadamente na Petrobras, a Lei das Estatais já nasceu sob pressão.

Até as vésperas da sua sanção, havia forte movimento de deputados contra a quarentena exigida no artigo 17. Esse artigo estabelece o período de quarentena de 36 meses para que dirigentes de partidos e pessoas que tenham atuado em campanhas eleitorais assumam postos de direção e de conselho de administração de estatais, e ainda define a experiência profissional necessária para os dirigentes de estatais. Entre os 97 artigos da Lei 13.303, este é certamente dos mais combatidos.

Após ter sido sancionada pelo então presidente Michel Temer, chegou a haver um movimento de deputados para que o Senado concordasse com um projeto para pelo menos reduzir o prazo da quarentena. Uma das ideias era diminuí-la para 12 ou 18 meses. Mas, na onda moralizadora da época, prevaleceram os 36 meses.

Na investida atual, a intenção dos parlamentares foi simplesmente acabar com a quarentena, o que foi conseguido ao menos temporariamente. O embate começou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) do PCdoB, partido aliado do governo, questionando o prazo estabelecido para quem exerceu funções em estruturas decisórias de partidos ou campanhas eleitorais. Outro ponto criticado foi a proibição de que ex-ocupantes de cargos políticos sejam nomeados para cargos de direção ou conselhos de administração de empresas estatais. Levantamento feito pela imprensa calculava que de duas a quatro dezenas de pessoas indicadas pelo governo Lula para conselhos de administração poderiam ser afetadas.

O relator do processo, o então ministro Ricardo Lewandowski, hoje aposentado do STF e atual ministro da Justiça, aceitou os argumentos da ADI. Ele avaliou que a Lei das Estatais estabeleceu “discriminações desarrazoadas e desproporcionais – por isso mesmo inconstitucionais – contra aqueles que atuam, legitimamente, na esfera governamental ou partidária”. Considerou inconstitucional a exigência da quarentena e proibiu a manutenção do vínculo partidário apenas a partir do momento em que a pessoa assume o cargo de diretor ou conselheiro da estatal. Também suspendeu outro trecho, que impede que ministros de Estado e secretários sejam indicados para a diretoria e conselho das estatais.

Após o voto do relator, no dia 13 de março de 2023, o ministro André Mendonça pediu vista e interrompeu o julgamento. Três dias depois, Lewandowski concedeu liminar mantendo a quarentena suspensa até que o julgamento terminasse. Um dos argumentos utilizados pelo PCdoB era que a regra criminalizava os políticos e impedia a nomeação de bons profissionais, como se não houvesse alternativas fora da política.

Em dezembro, quando o caso começou a ser analisado no plenário, André Mendonça afirmou que a Lei das Estatais trouxe um melhor resultado financeiro para as companhias. Para o ministro, não cabe ao STF considerá-la inconstitucional. “Penso que, se ela (a lei) pode ser melhorada, não é ônus do Supremo Tribunal Federal retirar por inconstitucionalidade algo que foi construído para trazer boa governança. Não são as pessoas. São as situações de risco a que se pode submeter pessoas”.

O tema voltou à discussão na quarta-feira da semana passada. André Mendonça acrescentou números a seu voto que demonstrariam que a lei fez com que as estatais revertessem em 2016 os prejuízos que tiveram de 2014 a 2015. Em aparte, o ministro Gilmar Mendes, que votou pela inconstitucionalidade das regras, rebateu que a Lei das Estatais teria melhorado o resultado das empresas, salientando a influência do quadro macroeconômico na recuperação. Contrário à lei, o ministro Flávio Dino afirmou que “não existe canonização por concurso público e não existe demonização pela participação na política”.

Ao final, o STF validou a constitucionalidade da Lei das Estatais por oito votos a favor e três contras. Os ministros decidiram, no entanto, por unanimidade, manter as indicações feitas desde o ano passado, quando a restrição foi suspensa. Aceitaram o argumento do ministro Dias Toffoli, que votou a fator da lei, mas entendeu que a saída dos atuais gestores criaria instabilidade.

Mesmo derrubada pelo Supremo, a liminar foi bem-sucedida para a manutenção nos cargos de várias pessoas nomeadas pelo governo Lula. A lei buscou, entre outras medidas, evitar o aparelhamento político e a prevalência de interesses partidários sobre o interesse comum. Ainda que tenha levado cerca de um ano para que o STF julgasse constitucionais as exigências, e a permanência nos cargos dos indicados, a decisão não deixa mais dúvidas de que o dispositivo é legítimo, tornando extremamente difícil que volte a ser questionado no futuro.

Fonte: Valor Econômico