Licitação para iniciativa no Triunfo do Xingu está prevista para o próximo dia 28
A unidade de conservação mais desmatada do Brasil será a primeira a experimentar um novo modelo de concessão pública privada para restaurar a Floresta Amazônica e gerar emprego e renda por meio da venda de créditos de carbono. Uma parcela de 10,3 mil hectares da Área de Preservação Ambiental Triunfo do Xingu, no Pará, será oferecida para propostas de empresas na B3, no dia 28.
É a primeira vez que uma unidade de conservação pública será concedida à iniciativa privada para restauração e exploração de créditos de carbono. Num contrato de 40 anos, a empresa concessionária terá que restaurar a área, em que a floresta amazônica deu lugar a um pasto.
O contrato permite a venda de créditos de carbono, mas compromete a empresa a investir nas comunidades do entorno. A exploração sustentável de madeira de espécies nativas na área restaurada também será permitida, além da possibilidade de gerar receitas com outros serviços ecossistêmicos.
O governador do Pará, Helder Barbalho, destaca que a escolha da área tem importância prática e simbólica.
— Essa área foi grilada e o estado conseguiu na Justiça reaver o território público. Por ser uma APA, era necessária a recuperação da floresta. O Pará dará a primeira oportunidade ao Brasil de concessão para restauração em áreas públicas. Temos certeza de que representará um novo paradigma para restaurar áreas de floresta. Mas também é um projeto simbólico por se tratar de grilagem em área de proteção ambiental, por ser na área do estado que mais sofre pressão pela entrada da pecuária em floresta — frisa o governador.
Segundo Helder, a concessão deverá movimentar R$ 1,5 bilhão, com rentabilidade de R$ 250 milhões aos investidores privados. Haverá a criação de 2 mil empregos em atividades como produção de mudas e plantio. O projeto também contempla a instalação de posto policial, construção de escola e unidade de saúde.
O edital prevê que a empresa vencedora deverá investir R$ 258 milhões na instalação e na operação da concessão. A estimativa é que 3,7 milhões de toneladas de carbono serão sequestradas. Isso equivale a 330 mil voltas de avião ao redor do planeta. O Brasil, só em 2023, emitiu 2,3 bilhões de toneladas de gases estufa.
‘É preciso dar opção’
A iniciativa foi possível após uma mudança na lei de gestão de florestas públicas em 2023. Até agora, concessões eram dadas apenas para a exploração manejada de madeira em florestas públicas federais e estaduais. A área é um primeiro passo de um modelo que especialistas veem como promissor para restaurar a Amazônia em escala.
— Não adianta só deter o desmatamento, tirar o grileiro. É preciso dar uma opção que substitua a economia que gira em torno do desmatamento. O contrato prevê que parte da receita volte para o território, em empregos, investimentos sociais e de infraestrutura — ressalta Olavo Tatsuo Makiyama, gerente de áreas públicas na Amazônia da The Nature Conservancy (TNC) Brasil, que, com um consórcio de consultorias, deu apoio técnico à estruturação do programa de concessão.
Até a COP30, mais áreas federais e estaduais poderão estar num portfólio de concessões, parte do pacote de iniciativas brasileiras de restauração e desenvolvimento sustentável da Amazônia. Está em estudo no Tribunal de Contas da União a concessão de 98,3 mil hectares da Floresta Nacional do Bom Futuro, em Rondônia.
Na mesma APA Triunfo do Xingu estão selecionadas outras áreas desmatadas e griladas que devem ser colocadas em breve para concessão, totalizando mais 20 mil hectares. Helder estima que o anúncio das novas licitações poderá ser feito ainda este mês.
O BID estuda a possibilidade de financiar uma garantia para o projeto em Triunfo do Xingu, diz a especialista de parcerias público-privadas do banco Carolina Lembo. Segundo Lembo, o banco acredita no modelo de concessão para impedir o desmatamento e viabilizar a restauração.
Diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da TNC, Karen Oliveira explica que a parceria público-privada permite dar escala à restauração e cria um mecanismo financeiro sólido e com segurança jurídica e monitoramento.
— Um aspecto fundamental é gerar renda para quem vive na Amazônia. No caso, são pequenos produtores rurais do entorno da APA — afirma Oliveira.
Segundo o Prodes, um dos programas que monitora o desmatamento do Inpe, a Triunfo do Xingu perdeu 4.372 km² de florestas, ou 34,87% do total, desde 2008. Ela mede 16.792,8 km², nos municípios de Altamira e São Felix do Xingu, extensão 14 vezes maior que o município do Rio.
A área que será licitada e foi renomeada como Unidade de Recuperação Triunfo do Xingu foi grilada e teve 103 km² de floresta derrubados para a criação de pasto ao longo de cinco anos.
Fonte: O Globo