Aumentar a eficiência da infraestrutura não tem efeito somente na economia, mas na vida de cada cidadão
A infraestrutura logística no Brasil adquiriu, ao longo dos anos, um protagonismo cada vez maior, dado seu potencial de indução do crescimento e melhoria da produtividade e competitividade do país. Esse protagonismo é de suma importância, considerando que, dentre as 20 principais economias do mundo, o Brasil é a única que não mantém uma posição no quartil superior das que mais investem em infraestrutura na relação com o PIB. Pelo contrário, sua taxa média de investimento em infraestrutura de transportes tem sido, ao longo dos últimos 30 anos, em torno de 0,8% do PIB/ano, ao passo que concorrentes diretos realizaram mais de 2,5%.
Consequentemente, no conjunto de todos os resultados negativos está uma incidência de 12,32% de custos logísticos sobre o faturamento bruto das empresas embarcadoras. Na formação destes custos, 65% estão relacionados ao transporte de matérias-primas e produtos, tanto na longa distância quanto na última milha logística. Portanto, investir com qualidade é condição essencial para o desenvolvimento.
O biênio 2024/2025 tem que ser marcado por um país que irá definir seu portfólio de projetos pautado pelas interações entre o sistema de atividades econômicas; a dinâmica da circulação de bens e serviços; e os volumes de tráfego. Estes três fundamentos são básicos para que a logística se materialize de forma integrada, com todas as características de suprimento e escoamento moldadas para que o transporte e suas redes multimodais não se constituam em fator negativo para a competitividade do país.
A partir do estudo da dinâmica entre os sistemas de transportes, o sistema de atividades e a circulação, faz-se necessária a concepção de cenários que influenciem os projetos e investimentos em infraestrutura com foco na evolução da produtividade. É primordial evitar o planejamento a partir de portfólios influenciados pelo jogo político. O conceito aqui defendido é que demandas consolidadas, reprimidas ou garantidas no futuro necessitam de respostas nos projetos e investimentos.
No biênio 2024/2025, um novo Plano Nacional de Logística (PNL) emergirá a partir de prioridades trazidas pelos Estados. A Fundação Dom Cabral, por meio de sua Plataforma de Infraestrutura em Logística de Transportes (PILT FDC), modela cenários multimodais para o Brasil, que apontam para princípios que deveriam direcionar os planos estratégicos.
O primeiro princípio é a coordenação e integração das cadeias de suprimentos e cadeias produtivas por microrregião, sem se descartar as conexões com grandes eixos nacionais. Defende-se a visão de corredores logísticos formados por modais de transportes (ferrovias e hidrovias, por exemplo) que proporcionem redução de custos operacionais, conectados a modais alimentadores com características de redes com dispersão e capacidade de porta-a-porta (rodovias, por exemplo).
Na sequência, outros princípios devem ser inseridos: eficiência e qualidade dos investimentos públicos e privados; elaboração de estratégias para competir com outros países, entre elas a constituição de redes transoceânicas; fortalecimento dos arranjos produtivos nas microrregiões, sem perder a integração com outros corredores logísticos nacionais; adição de valor nas cadeias produtivas nos estados; e desenvolvimento social, respeitando a preservação do meio ambiente e comunidades protegidas.
Espera-se que o país inicie a racionalização da logística nacional originalmente nas suas macrorregiões, com ordenamento do território pautado nos potenciais de produção e consumo, e refletidos na eficiência do escoamento. Para tal, os planos de longo prazo precisam fomentar a multimodalidade, aproveitando as vantagens comparativas dos vários sistemas de transporte, valorizando as estruturas atuais e futuras, e promovendo adição de valor e renda para empresas e pessoas.
Especificamente ao Brasil e aos seus planejadores, é imposta uma solução para o vazio ferroviário no Nordeste, Norte e Centro-Oeste; vazio este que desfavorece a economia das fronteiras agrícolas e novas áreas de produção, e leva empresas a transportarem cargas por milhares de quilômetros prioritariamente em rodovias, em geral de baixa qualidade, com um custo logístico até 50% superior ao de um produtor nos EUA.
A sustentação de investimentos em infraestrutura de transportes nos próximos 15 anos é fundamental para ganhos de produtividade. É o primeiro passo, não só para a solução dos gargalos que hoje acarretam custos e tempos excessivos, mas para atender a uma demanda reprimida. A perda de competitividade atinge três alvos fixos: a eficiência das cadeias de suprimentos, que, uma vez globalizadas, passam a sofrer com concorrentes mais bem estruturados; a margem de lucro das empresas; e, em terceiro, a renda geral da sociedade. Nenhuma delas tem compensação imediata, e todas deterioram as cadeias produtivas. Portanto, aumentar a eficiência da infraestrutura não tem efeito somente na economia, mas na vida de cada cidadão.
Os projetos mapeados em programas governamentais e em planos de logística, espalhados por diferentes instituições, são mais que conhecidos. Mas, a sociedade precisa compreender que os embates políticos que envolvem tais projetos não têm a profundidade necessária para a sua realização. É preciso que o planejamento de longo prazo, protegido da famigerada agenda política, faça parte do cotidiano brasileiro, que a técnica se sobreponha ao discurso, a transparência impere sobre a corrupção, e o bom legado seja prioridade.
O Brasil carece de visão de longo prazo para garantir avanço no modo como projetos estruturantes podem se transformar em saltos de crescimento sustentável. Ao sonharmos com um ambiente institucional que protege o planejamento de longo prazo, acende-se uma centelha de esperança por meio da qual os brasileiros podem certificar-se de que nem tudo nesse país se alimenta do imediato, do interesse partidário, enfim, de uma agenda que se distancia cada vez mais do futuro brilhante que o Brasil pode ter.
Fonte: Época Negócios