Por Mirian Leitão,
A perda de 12% do PIB da América Latina com as mudanças climáticas até 2050, segundo estudo feito pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), mostrado por matéria de Roberto Lameirinhas, nesta segunda-feira no Valor, é uma parte do problema que os países precisam começar a encarar. Estamos diante de eventos climáticos extremos. Este ano, o Brasil passa por enchentes no Sul, seca recorde, pelo segundo ano, no Norte, queimadas, isso afeta a economia diretamente e há muito tempo os especialistas têm alertado sobre isso.
Como diz o artigo do jornalista Claudio Angelo publicado nesta segunda-feira no O Globo, “Não foi por falta de aviso”. Angelo se especializou na área ambiental e climática e acabou deixando os jornais e hoje trabalha no Observatório do Clima. Em parceria com Tasso Azevedo, escreveu um livro maravilhoso, que recomendo, chamado “O silêncio da motosserra – quando o Brasil decidiu salvar a Amazônia”.
Mudança climática sempre foi um problema econômico, sempre foi um problema político, sempre foi um problema da saúde, sempre esteve ligado às questões sociais. O país tem que olhar com mais seriedade para esse tema, se preparar para esses eventos extremos que vão ficar cada vez mais frequentes. Principalmente, nós, jornalistas, temos que encarar todos esses eventos não como uma coisa à parte, mas como parte da nossa análise diária.
Claudio Angelo conta em seu artigo que, em 2011, chegou animado na redação, tinha sido o único jornalista brasileiro a voar com a Nasa para ver o derretimento da Groenlândia, seu chefe disse que ele precisava ouvir o outro lado, mas, neste caso, o outro lado é o que nega a mudança climática. Não tem mais hoje nenhum cientista sério que negue essa realidade. É preciso que todos os especialistas, nas mais diversas searas, entendam que a questão ambiental e climática tem a ver com cada uma das áreas.
Na economia, há o efeito mostrado pela Cepal na perda Produto Interno Bruto (PIB) que alerta, pode chegar antes do previsto. A seca nos rios amazônicos, por exemplo, dificulta o transporte de mercadorias. A enchente severa no Rio Grande do Sul agora tem mostrado impacto sobre o plantio. A seca por dois anos seguidos afetou a capacidade de produção por commodities, especialmente a soja, na Argentina. A Bolívia também enfrenta vários problemas causados pela seca, incluindo incêndios. No Brasil há o agravante de o fogo ser provocado por criminosos, o que piora uma situação que já seria grave.
No meio disso tudo, chama atenção o fato de o governo federal cortar 18% dos recursos destinados à transição energética no Projeto de Lei Orçamentária de 2025. Como escrevi outro dia aqui, a transição energética se tornou mais uma dessas placas colocadas para não se dizer nada. O Ministério de Minas e Energia fala de transição energética, mas nunca pensou de fato nesse tema. Há conflitos dentro do governo entre quem quer pensar realmente o futuro, nos ministérios do Meio Ambiente, da Fazenda e do Planejamento com o Ministério das Minas e Energia que ainda está focado nos combustíveis fósseis.
O corte no orçamento é um sintoma de como o país não levou a sério ainda o que realmente significa transição energética e porque ela precisa ser feita. A questão ambiental atravessou o jornalismo econômico. O jornalismo tem que entender isso mais profundamente, que as mudanças climáticas devem estar na pauta, independentemente de estarmos vivendo ou não um evento extremo, esse será o assunto do resto das nossas vidas.
Fonte: O Globo