É hora de construir

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Jornal do BrasilSociedade AbertaA-1125/04/2010

É hora de construir

Francis Bogossian
Engenheiro

Os desabamentos que ocorreram nas favelas, não só no Rio como em outras
cidades brasileiras, não é culpa dos atuais prefeitos ou governadores. É o
resultado de mais de 20 anos da falta de uma política habitacional, onde o
crédito para construção imobiliária foi substituído pela facilidade de
financiamento para material de construção.

Com o fim do Banco Nacional da Habitação (BNH) em 1986 e sem qualquer outra
política habitacional para o país, as favelas cresceram e as obras de
urbanização nos morros contribuíram para atrair mais moradores para as áreas
de risco. Não há eco-limite que barre este processo sem uma política
habitacional consistente.

Agora temos uma nova esperança de que este quadro se modifique com o programa
Minha Casa, Minha Vida, que traz no seu contexto a retomada do programa de
financiamento imobiliário.

O programa foi lançado em março de 2009 com a meta de construção de um
milhão de moradias até 2010. O plano é ambicioso e possivelmente não
atingirá esta meta. Só 41% deste total foram contratados. Mas, ao que tudo
indica, está no caminho certo.

Embora lançado em março, demorou alguns meses até que conseguisse deslanchar
e superar os obstáculos da burocracia, os entraves do Tribunal de Contas da
União etc. As primeiras unidades só serão entregues no final deste ano.

A maioria dos contratos de financiamento do programa “Minha Casa, Minha
Vida” só foram assinados a partir do segundo semestre do ano passado.
Mesmo assim, nestes 12 meses, a Caixa Econômica Federal fechou nada menos de
408.426 financiamentos de imóveis, representando um investimento de R$ 22,8
bilhões. Somente no primeiro trimestre de 2010, foram contratados 133.146 novas
moradias e a demanda continua aquecida.

No Rio estamos vendo, enfim, o Governo Federal, o Estadual e o Municipal, unidos
em prol dos interesses soberanos dos menos favorecidos.

O Rio de Janeiro, segundo Estado em arrecadação de impostos federais, vinha
sendo há décadas, de modo injusto, um dos últimos contemplados com recursos
da União. Vimos ser praticada uma política perversa e continuada, parecendo
mesmo premeditada para esvaziar nosso Estado.

Desde 2007, no entanto, esta política foi finalmente revertida e hoje já
podemos sentir a retomada do desenvolvimento do Rio de Janeiro em diversos
setores.

Não é construtivo nem justo, logo agora, em decorrência de chuvas
excepcionais, botar a culpa em prefeitos e nos governos estaduais, em vez de
apoiá-los para melhor desempenharem seus papéis, sobretudo quando existem
instrumentos disponíveis para tal.

Vamos nos dar as mãos para reerguer todos os municípios fluminenses atingidos
pelas chuvas, aproveitando o recente momento dramático, para alavancar medidas
que contemplem escopos similares ao da Geo-Rio, – fundação carioca que cuida
de nossas encostas -, para atender aos demais municípios, seja a nível
estadual ou federal. Devemos cobrar, isto sim, maior destinação de recursos
para as ações preventivas e não apenas para as obras de contenção após os
acidentes.

Despindo-nos de partidarismos e prestigiando projetos como o “Minha Casa,
Minha Vida”, vamos torcer para que venham muitos outros com o mesmo
arcabouço, que, se não eliminarem em definitivo as atuais lacunas, pelo menos
hão de suavizar bastante o problema da habitação popular brasileira.

A grande contribuição que o estado e os municípios terão a seu encargo será
na área de transporte. As novas moradias que estão sendo construídas precisam
contar com um eficiente transporte de massa, para satisfazer os moradores e
tornar efetiva a remoção das favelas. Morar nas favelas, em áreas de risco,
não é uma opção. É falta de opção dos menos favorecidos.

Este é o momento da mudança mas, assim como Roma não foi feita em um dia, o
Rio de Janeiro precisa de tempo e de dinheiro para se recuperar. A sociedade
civil carioca e fluminense estará atenta, fiscalizando o poder público para
que o Rio não desperdice as oportunidades que se apresentam.

Francis Bogossian é presidente do Clube de Engenharia e da Associação das Empresas de Engenharia (AEERJ)

Artigo
publicado no Jornal do Brasil – domingo, 25 de abril de 2010 –
Pág, A-11