Brasil terá metas de longo prazo por setor para reduzir emissões

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Em seminário, Marina Silva informou que ministério e especialistas constroem proposta ambiciosa para contabilizar os impactos do desmatamento

Ainda em construção pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima com diferentes atores da sociedade, as novas contribuições nacionalmente determinadas (NDCs, na sigla em inglês) do Brasil devem “ser ambiciosas”, abordar metas por setores e contabilizar os impactos do desmatamento. A informação foi antecipada pela ministra da pasta, Marina Silva, na abertura do seminário “Enfrentando mudanças climáticas e acelerando a transição energética”, realizado no dia 2 de outubro, no Rio.

A atualização das NDCs ganha ainda mais destaque no cenário atual de emergência climática. As chamadas NDCs são objetivos de longo prazo estabelecidos por cada país para redução das emissões e adaptação aos impactos da mudança climática, no âmbito do Acordo de Paris, de 2015. A cada cinco anos é preciso apresentar uma versão atualizada. Em meio à presidência brasileira do G20, Marina também afirmou que os países integrantes do grupo têm “grande responsabilidade” e que devem liderar o enfrentamento às mudanças climáticas. “O G20 representa 80% das emissões e 80% do dinheiro. Se o G20 resolver fazer o dever de casa, muda em 80% a realidade atual”, disse.

Uma das mudanças importantes da nova NDC brasileira, revelada pela ministra, é a inclusão de metas por setor. “Agora é obrigatório que todos tenham metas setoriais, e nós temos que ter metas de redução do CO2 para energia, transporte, agricultura, indústria e um setor que não é setor, que é o desmatamento”, disse Marina. A estratégia se insere em um cenário no qual agricultura e pecuária – que correspondem à parte das emissões de gases do efeito estufa do Brasil, como metano e óxido nitroso – vão se manter como atividades de peso na estrutura da economia do país.

“Na medida em que agricultura e pecuária continuarão importantes, o Brasil terá que não apenas zerar emissões de carbono, mas se preparar para ter emissões negativas para compensar as emissões de metano e óxido nitroso”, defendeu o professor titular da Coppe/UFRJ e especialista em transição energética Roberto Schaeffer. Ao lado de outros especialistas, Schaeffer colabora com o ministério para a construção das novas NDCs.

Concentradas principalmente na agropecuária, as emissões de metano e óxido nitroso têm origem no processo digestivo das vacas, cultivo de arroz e manejo de esterco, além de fertilizantes sintéticos. A ministra evitou dar detalhes sobre como será contabilizada a contribuição do desmatamento nas NDCs. O cuidado não se deve a “segredo ou falta de transparência”, mas porque o tema demanda assertividade. “Estamos no processo. E a metodologia exige que, quando o governo fale, o faça em cima de um resultado construído com todo o rigor científico, com base em dados e evidências”, afirmou Schaeffer.

O prazo para as nações encaminharem as novas metas vai até fevereiro, mas o Brasil pretende apresentá-las na Conferência do Clima do Azerbaijão (COP29), em novembro. As atuais NDCs brasileiras preveem reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 53% até 2030 e zerar as emissões líquidas até 2050. Isso significa um equilíbrio entre emissões e remoções desses gases da atmosfera por meio, por exemplo, das florestas na captura de carbono. O grupo de especialistas tem feito simulações de diferentes cenários de emissões e de desmatamento até 2050, considerando a influência dos distintos setores da economia brasileira, para se alcançar as metas com o menor custo para o país. “Isso significa que, em função de ter mais ou menos desmatamento, vai sobrar um orçamento de carbono maior ou menor para os outros setores da economia”, disse Schaeffer.

Hoje, metade das emissões brasileiras ocorrem por conta do desmatamento. O governo brasileiro já se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal em todos os biomas até 2030 e estabeleceu, em 2023, a Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas no Brasil (PPCD). Na avaliação da secretária-geral do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), Rosa Lemos de Sá, um mix de financiamentos que vá além dos fundos multilaterais é essencial para atingir as metas necessárias de cada país. “Esses recursos não são suficientes, mas eles se somam aos recursos orçamentários dos governos, da filantropia e também do setor privado”, aponta.

No seminário, Marina afirmou ainda que esperava avanços na conclusão do Grupo de Trabalho de Sustentabilidade Ambiental do G20. A expectativa foi confirmada na declaração final do GT, cujos trabalhos foram encerrados no dia 3, também em reunião no Rio. A inclusão dos oceanos nos planos climáticos nacionais e nas NDCs e o planejamento espacial marinho foram citados por Marina como destaques do documento do grupo, que também endossa o Mecanismo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês).

Já a pesquisadora sênior do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) Daniela Lerda reforçou a importância dos territórios indígenas, tanto por questões éticas quanto estratégicas. “Nos últimos 30 anos, territórios indígenas tiveram perda de vegetação de 1%, para um recuo de 28% na média”, declarou Lerda.

O seminário “Enfrentando mudanças climáticas e acelerando a transição energética” fez parte do evento de outubro do projeto G20 no Brasil, que tem o Governo do Estado do Rio como Estado anfitrião, Rio capital do G20 como cidade anfitriã, patrocínio de JBS, apoio do BNDES e realização dos jornais “O Globo” e Valor e da rádio CBN.

Fonte: Valor Econômico