O Brasil vive uma situação vergonhosa, que é ter um cemitério de obras públicas paralisadas. Isso é histórico no país, e os números do Tribunal de Contas da União (TCU) mostram esse quadro. São obras que têm recursos do governo federal, a área em que esse órgão fiscalizador atua, mas acredito que, se formos mais a fundo, haverá mais obras abandonadas de estados e municípios.
Quando falamos de ineficiência na gestão de obras públicas e em paralisação, há diversos motivos. Em um trabalho feito pela Comissão de Infraestrutura da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic), conseguimos separar os prioritários, que eu chamo de “os sete pecados capitais”.
É preciso acabar com os leilões e contratar por concorrência, além de garantir os licenciamentos antes das licitações. Entre eles, estão os leilões feitos pelos governos, seja federal, estadual ou municipal, para a compra de material. A administração orça um valor de R$ 1 mil, por exemplo, e uma empresa diz que faz por metade do preço. E o administrador, com medo dos órgãos fiscalizadores e de recusar uma proposta barata, autoriza.
Das 8,6 mil obras paralisadas listados pelo TCU, a grande maioria está parada por causa disso: o chamado “mergulho de preço”. A empresa não consegue fazer por aquele preço. Não consegue comprar o material, pagar mão de obra, impostos. A conta não fecha, e ela abandona a obra. Já alertamos o governo para que não aplique esses pregões para os serviços de engenharia.
Há também a má qualidade dos projetos, boa parte incompleta. E os projetos têm sido contratados também por meio de pregão, o que é um erro. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), por exemplo, já soltou orientação para fazer contratação por concorrência.
A nova Lei de Licitações 14.133, que passa a ser obrigatória em janeiro de 2024, conceituou o que é projeto básico e projeto executivo. E a nova lei trará a chamada “matriz de risco”, obrigatoriedade de planejamento entre contratante e contratado, e quem vai ser responsável por gerir esse risco. É um avanço.
No Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, a União arca com 80% dos custos da obra. Mas do custo inicial. Os reajustes que acontecem ao longo do projeto, como aditivos e reequilíbrios econômico-financeiros, ficam por conta dos estados ou das prefeituras.
E muitos prefeitos só percebem isso durante a execução — e não têm condições de dar sua contrapartida. Isso leva à paralisação.
Há outra situação: quando a obra está 80% pronta, as prefeituras precisam equipá-la com móveis e contratar professores e enfermeiros, por exemplo. Muitas vezes, isso não estava previsto no custeio. Muitas unidades básicas de saúde foram paralisadas neste ponto, porque não havia recursos para isso.
E tem as emendas parlamentares, que são legítimas, mas não são repassadas aos municípios com o valor total da obra. Vão com 60% do valor da estrada, 50% do valor do hospital. E não se consegue complementar os recursos. As emendas vêm assumindo um papel maior em fornecer recursos para obras públicas.
Além disso, há morosidade e dificuldades nos licenciamentos ambientais, especialmente nas obras de maior porte. Esperamos a aprovação de uma nova lei de licenciamento ambiental que tenha mais racionalidade. Há uma multiplicação de órgãos que têm que atestar esse licenciamento. É preciso ter esse licenciamento antes da licitação e não depois.
E muitas obras estão sendo colocadas em concorrência com preços defasados, fora da realidade de mercado. Na pandemia, houve pressão de custos de materiais de construção.
Isso desequilibrou 90% dos contratos. Mas não existe legislação que oriente sobre como reequilibrá-los. Muitas solicitações de reequilíbrio solicitadas não tiveram resposta, e o resultado são obras paradas — e dinheiro jogado fora.
Por Carlos Eduardo Lima Jorge é vice-presidente de Infraestrutura da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic).