Com mudanças climáticas, infraestrutura escolar adequada é urgente

Aeerj > Notícias > Setor > Com mudanças climáticas, infraestrutura escolar adequada é urgente

Temperaturas nas salas de aula impactam no nível de aprendizagem; estrutura precária traz previsíveis reflexos no abandono e na evasão

As altas temperaturas têm afetado a rotina dos estudantes das redes públicas em todo o Brasil. No Rio de Janeiro, comunidades organizaram protestos evidenciando a falta de infraestrutura das escolas para amenizar o calor nas salas de aula. O ano letivo no Rio Grande do Sul começou com atraso e já sofre interrupções por causa do despreparo da maioria das unidades de ensino para enfrentar o novo contexto climático.

Ondas de calor e desastres ambientais têm sido cada vez mais frequentes. De formas diferentes, esses eventos afetam diretamente os processos de aprendizagem dos alunos, como apontam estudos científicos.

O economista ambiental R. Jisung Park, da Universidade da Pensilvânia, realizou um estudo sobre os impactos do calor no desempenho acadêmico. A pesquisa, publicada em uma revista científica, avaliou, entre outras questões, como o aumento da temperatura influencia a capacidade cognitiva de estudantes universitários. Os dados mostraram que, em média, alunos submetidos a temperaturas de 30 °C tiveram resultados inferiores em testes padronizados, se comparados àqueles expostos a 23 °C.

O estudo também apontou que as variações climáticas agravam as disparidades socioeconômicas entre os estudantes. Isso ocorre porque o calor afeta mais fortemente estudantes negros e latinos, que têm menos probabilidade de contar com ar-condicionado em casa ou nas instituições de ensino.

Além da cognição, a exposição a altas temperaturas pode afetar também a saúde mental de alunos e professores, ainda mais quando se está a falar de salas superlotadas e de crianças impactadas por outras tantas desigualdades.

Em relação a crianças em idade escolar, o estudo “O calor extremo afeta o desenvolvimento e a saúde na primeira infância” (PDF – 394 kB), desenvolvido por pesquisadores de Harvard, aponta que “o calor está associado à lentidão da função cognitiva e à redução da capacidade de concentração”. A pesquisa destaca que a temperatura ideal para manter um bom nível de atenção é de 22 °C ou menos.

Uma adversidade geralmente não é causada por um único fator, mas por um somatório deles. Além da ausência de climatização adequada na maioria das escolas públicas em diversos Estados brasileiros, os estabelecimentos de ensino enfrentam outras dificuldades para lidar com as ondas de calor, como a falta de acesso dos alunos à água potável e a redes elétricas, além de transporte escolar e condições sanitárias precárias ou inadequadas.

Dados do último Censo Escolar, divulgado pelo Inep, demonstram que 7.500 escolas ainda não dispõem de água potável, e outras 3.200 sequer têm acesso a qualquer fonte de água. A pesquisa também aponta que só 3 em cada 10 salas de aula que atendem estudantes da educação básica pública têm climatização.

Em 2023, os tribunais de contas brasileiros e entidades de controle externo promoveram a Operação Educação, uma ação que contou com visitas a 1.082 escolas de 537 municípios em todo o país. A iniciativa teve a participação de 785 técnicos de 32 órgãos de controle externo, que avaliaram cerca de 200 itens relacionados à segurança e infraestrutura das instituições, incluindo refeitórios, bibliotecas, salas de aula e quadras esportivas.

Das escolas visitadas, pelo menos 15,57% apresentaram desconformidades aparentes no abastecimento de energia elétrica, item fundamental para a manutenção da climatização dos ambientes. Os resultados desse trabalho estão subsidiando ações de controle de tribunais de contas.

A infraestrutura escolar tem um impacto direto e significativo na aprendizagem e no desempenho dos alunos, já que ambientes físicos bem estruturados contribuem para a motivação, a concentração e até para a permanência dos estudantes na escola. O ambiente escolar repercute também em questões emocionais. Escolas bem cuidadas transmitem aos alunos a sensação de valorização e pertencimento, com efeitos positivos na autoestima e na motivação para estudar.

Se, no passado recente, a infraestrutura escolar já era uma questão fundamental a ser equacionada, atualmente, com os repetidos eventos climáticos extremos, o tema passa a ser uma pauta prioritária para gestores públicos, congressistas, órgãos de controle, famílias e sociedade. Estabelecer condições mínimas de conforto térmico e planos de ação para mitigar o calor nos ambientes escolares é uma necessidade urgente.

Ao não superarmos esse desafio, mais uma vez estaremos condenando os estudantes a um retrocesso da aprendizagem, que já é considerada insuficiente, além dos previsíveis reflexos no abandono e na evasão. O impacto social e econômico ao país, nesse contexto, será indiscutivelmente superior ao custo financeiro necessário para essas adaptações.

Fonte: Poder360