Companhias de construção pesada encolheram sensivelmente por conta da Lava Jato
Com a retomada de grandes obras de infraestrutura, graças a marcos regulatórios e concessões que estimularam investimentos privados em diferentes áreas, as empresas começam a sentir falta dos serviços prestados por grandes construtoras e o ecossistema de seu entorno, que encolheram sensivelmente por conta da Lava Jato.
Com previsão de investir R$ 69 bilhões nos próximos cinco anos, a Sabesp, por exemplo, coloca a ameaça de faltar fornecedores como um dos maiores riscos à execução do projeto. “O mercado de obras passou por uma grande dificuldade pela questão da Lava Jato e, hoje, há um número menor de empresas”, afirma Carlos Piani, presidente da Sabesp. “Temos mais empresas pequenas e médias e vamos precisar de muitos prestadores de serviço, de todos os tamanhos. ”
A Sabesp não é a única a falar do problema. Em conversas informais e pedindo para não serem identificadas, concessionárias de rodovias e outros modais de transporte, empresas de energia e saneamento relatam o mesmo problema. “Vai faltar empresa”, afirma o comandante de uma multinacional europeia de infraestrutura, que tem ampliado a presença em grandes projetos no Brasil.
‘Jogaram o bebê fora com a água do banho’
Claudio Frischtak, sócio da Inter.B, uma das mais tradicionais consultorias especializadas na área, diz que a Lava Jato foi um processo necessário de combate à corrupção, mas que a falta de legislação clara que punisse apenas as pessoas responsáveis pelos crimes e não as empresas criou excessos. “Jogaram o bebê fora com a água do banho”, diz ele.
Ele cita, por exemplo, que uma das maiores dificuldades das empresas que vão fazer ofertas em leilões de concessões e privatizações é ter uma visão clara e firme sobre os custos que terão com “epcistas” (da sigla em inglês para engenharia, provisionamento e construção), como são chamadas as empreiteiras subcontratadas para tocar as obras.
“Uma ‘epcista’ precisa de anos de experiência para fazer uma proposta firme com preço e prazo e essa área foi muitíssimo reduzida em função das consequências da Lava Jato e, posteriormente, da crise profunda causada pelo governo [da ex-presidente] Dilma [Rousseff]”, afirma Frischtak. Sem saber esse custo, diz ele, é difícil conseguir calcular o retorno que a concessionária terá numa eventual proposta por um ativo.
Profissionais se aposentaram ou mudaram de área
Segundo Frischtak, com as crises sucessivas que duraram mais de uma década, muitos profissionais que levaram anos para desenvolver a expertise na área se aposentaram, mudaram de campo de atuação ou estão desatualizados. “Essa é um segmento em que a experiência prática conta muito”, diz. “Por mais que haja registros e técnicas formais, o conhecimento está na cabeça e na vivência dos profissionais. ”
Também é uma área que requer trabalho braçal, em qualquer lugar do mundo, e que vive um momento particularmente difícil no Brasil. Muitos trabalhadores da construção civil se tornaram motoristas de aplicativos e têm complementado renda com auxílio desemprego ou Bolsa Família. “Vivemos o que pode ser considerada uma situação de pleno emprego, o que é um agravante para uma área que não tem uma automatização óbvia”, afirma.
De 2011 até o ano passado, a receita bruta anual das 25 maiores construtoras do País foi de cerca de R$ 50 bilhões para pouco menos de R$ 39 bilhões, segundo a revista O Empreiteiro. As vagas foram de 322 mil para 88 mil.
Segundo Humberto Rangel, diretor executivo do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon), o setor vive um momento de retomada e tem agilidade e capacidade de recuperação, ao contrário de áreas como a industrial, onde investimentos demandam mais tempo para amadurecer.
Fonte: O Estadão