O pré-sal é nosso

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Correio Braziliense (DF)Opinião03/05/2011

O pré-sal é nosso

Francis Bogossian,
Presidente do Clube de Engenharia e da AEERJ

A Agência Nacional de Petróleo (ANP) inicia consulta pública para novos contratos de concessão e exploração. Já o contrato de partilha está no Congresso para ser votado novamente. E agora, com muita clareza, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em recente visita ao Brasil, colocou de forma transparente em sua agenda de conversações com a presidente Dilma Rousseff o interesse de seu país de vender equipamentos, serviços e participar da exploração do petróleo do pré-sal, anunciando desde já interesse na compra antecipada do que vier a ser extraído. O objetivo maior é gerar riqueza e empregos nos Estados Unidos.

Se, do lado de lá, os dirigentes americanos fizeram o dever de casa, temos que olhar agora para o nosso lado. O que, nós, brasileiros, queremos? Exatamente a mesma coisa, inclusive porque nossa balança comercial com os Estados Unidos está deficitária em mais de US$ 8 bilhões. A presidente Dilma colocou também com muita objetividade o que o Brasil espera dos Estados Unidos. Mas, na área de petróleo, precisamos explicitar melhor nossa estratégia e nosso timing de exploração e comercialização. Afinal, já estamos entre os cinco países com as maiores reservas de petróleo do mundo. Quem vai ditar o ritmo de exploração do pré-sal? Os maiores produtores de petróleo (Estados Unidos, Rússia e Oriente Médio) atingem o seu ponto máximo de exploração até 2015. Depois disso, quem tem mais, pode vender mais e a que preço?

Esse quadro levou o Clube de Engenharia, que fez 130 anos de existência, a enviar carta à presidente Dilma, advertindo que o ritmo de extração de petróleo que querem impor ao Brasil contraria os interesses nacionais, provocando a desnacionalização do setor e dificuldades para o desenvolvimento de tecnologia própria em tempo hábil, já que o lobby de governos e multinacionais será muito forte para atender às necessidades futuras.

Nenhum país com reservas e produtor de petróleo escapa de pressão neste momento. Mas o Brasil é bola da vez porque era o 13º produtor de óleo e avançou nove posições com as descobertas do pré-sal. Em 2010, o Brasil garantiu o que deve ser um dos passaportes para um futuro grandioso enquanto nação, ao alterar o marco regulatório do petróleo e assegurar o pré-sal para os brasileiros. Na nossa opinião, foram criadas por força de lei as condições básicas para que essa afirmativa se torne viável.
1 — Ampliou-se a participação do Estado brasileiro no controle do ritmo da produção e na renda gerada por esse bem energético estratégico para as sociedades modernas.
2 — Estabeleceu-se o compromisso de a produção se fazer em sintonia com a expansão industrial necessária à exploração e produção do pré-sal.
3 — Capitalizou-se a Petrobras e a ela foi determinado o papel preponderante de operadora única nas atividades de exploração e produção do pré-sal.
4 — Criou-se um fundo para utilizar as receitas geradas pelo petróleo para superar as mazelas sociais históricas da nossa sociedade.

O Clube de Engenharia se orgulha de ter participado ativamente dos debates sobre o pré-sal e visto consagradas muitas das suas teses, aprovadas que foram pelo Congresso Nacional. Não obstante, considera que a aplicação desse texto legal sob a égide do interesse nacional não se fará sem esforços do governo federal e da sociedade brasileira para superar uma vez mais as pressões internacionais e dos seus porta-vozes internos no país, quando recrudescem os conflitos pelo domínio do petróleo por potências estrangeiras. O pré-sal é nosso, assim como em 1950 teve-se que ir às ruas para dizer: “O petróleo é nosso”.

Sob esse contexto, vimos com preocupação notícias na mídia sobre interesses dos Estados Unidos em buscarem no pré-sal a saída para sua dependência de petróleo, em áreas onde já não conseguem mais controlar como outrora. Sabemos o quanto a descoberta dessa gigantesca jazida reorientou estratégias de países com pretensões hegemônicas, inclusive com reativação da quarta frota norte-americana, a pretexto de “proteger o Atlântico Sul”.

Igualmente preocupante é o movimento intenso de grandes corporações internacionais no sentido de se instalarem no Brasil, em face da escala oferecida pelo pré-sal e diante de percentual de conteúdo local exigido. Apoiados num maior poder tecnológico, industrial e de financiamento no curto prazo nos seus países de origem, consolidam-se principalmente via aquisição de empresas de capital nacional, com vista a se tornarem os principais, quiçá únicos, fornecedores de bens e serviços no desenvolvimento do pré-sal. Ameaçam, desse modo, o aproveitamento integral das oportunidades de trabalho, em especial as com elevado conteúdo técnico, conhecimentos, tecnologias e expansão industrial, que só são integrais se apoiadas em capital nacional, necessárias para colocar o país independente de saberes e decisões externas. Assim como os Estados Unidos, queremos gerar riqueza e empregos no país.

Nesse sentido, o Clube de Engenharia registra sua expectativa de que o governo brasileiro reafirme a diretriz de produzir o pré-sal sob orientação do planejamento energético brasileiro, visando atender prioritariamente à demanda interna. Igualmente importante é a expansão plena e soberana das empresas de engenharia e serviços e das indústrias genuinamente nacionais pari passu à produção do pré-sal. Essas posições são coerentes com as posições diplomáticas assumidas pelo Brasil nas Rodadas de Doha, em defesa do mercado brasileiro.